O cheiro de café perfumou a casa, trazendo consigo um misto de sentimentos. Os lábios ensaiaram um meio sorriso, enquanto os olhos, marejados, mantinham-se fechados, em uma tentativa vã de reviver momentos que passaram a compor o seu coração. A música ao fundo, que inconsciente e timidamente fazia o seu corpo dançar, guiava para longe os pensamentos que, ora angustiavam, ora reconfortavam.
Em dado momento os olhos forçaram-se a abrir, evidenciando ainda mais, uma ou outra lágrima que rolava pelas faces. Introspectivo e distante, o olhar contemplava a mesa posta onde duas xícaras haviam sido caprichosamente colocadas lado a lado. Elas possuíam um colorido que contrastava com a energia ao redor, mas isso não trazia incômodo, muito pelo contrário. A garrafa térmica, agora repleta de vinho da Arábia, foi gentilmente acomodada poucos centímetros atrás das xícaras, completando o trio de todas as tardes.
A melodia continuava a rolar enquanto o aroma único adentrava as suas narinas inebriando a mente e acalentando a alma. Permitiu-se ficar alguns instantes ali, inerte, contemplando cada detalhe, outrora trivial, até que inspirou profundamente, enxugou as insistentes lágrimas com as costas das mãos, e puxou a cadeira, sentando-se sem pressa. Mais uma inspiração profunda e tudo parecia perfeito, não fosse o fato de que apenas uma das xícaras seria preenchida.
Sobre a autora:
Brasileira, paulistana e formada em Letras - Tradução desde 2018, Karla Gama sempre amou escrever, porém, nunca teve coragem para expor os seus escritos por não julgá-los bons o suficiente. Até chegar o momento em que decidiu mudar de atitude e, principalmente, de pensamento: passou a acompanhar escritores experientes em busca de aprimoramento, e a publicar os seus escritos.
Muito bom! Parabéns pelo texto!