Alladin

26 de out de 20202 min

Quando ela chegou

Quando ela chegou? As ruas já estavam vazias, cobertas pelo silêncio, tão barulhento, que cortavam os sons das palavras, que eu deveria falar; provavelmente se eu falasse estragaria aquela conversa toda, que nossos olhos, nossos toques, que nossas línguas falavam. Não sabia que horas eram, nem onde ela estava ou com quem estava; nesses momentos, pra que saber? Ela botava a mão, puxava meu zíper, sentava no meu colo, mordia minhas orelhas, ao longe parecia uma trapezista, subindo e descendo o meu corpo.

Com seu batom meio que borrado, mostrava o uso, daquela boca por alguém. Seu vestido preto tinha um pequeno rasgo atrás, como se alguém tivesse puxado, pedindo a clemência, o, por favor, de não vá embora, mas lá estava ela!

Puxando meu cabelo, arranhando minhas costas, puxando minha mão pra sua boca, regendo a orquestra dos prazeres carnais. E eu passeava dentro do seu paraíso! Sentia como um menino apaixonado pela professora, que nas aulas dela, corria pras primeiras cadeiras, só pra ver seu balançar, apagando o quadro.

Sua pele, alguns lugares tinha um toque de roxo porrada, como se alguém tivesse extrapolado o gozo e soltado a mão com ferocidade. E me puxava com os pés, soltava a mão no meu rosto, depois o beijava com gosto, apertava minha bunda, surrava em meu ouvido. Aquelas coisas eram o ciclo do infinito, passando em meu peito a sua língua, rasgando minha carne, tatuando seu belo rosto. E ela me prendia em suas pernas, esfregava em minha cara, sentava , deitava, abria a boca e depois sorria, como se eu fosse não apenas um cliente, não fosse só o boneco de dinheiro dela, não fosse mais outro cara que tinha os trezentos reais pra pagar seus serviços, mas o futuro pai dos filhos dela, seu verdadeiro e único amor. E assim os minutos se passaram, e a seção acabou, ela se vestiu novamente e foi embora, me deixando novamente a sua espera.


Pernambucano, ator, produtor cultural e escritor. Escreve versos desde a infância, influenciado pela família, mas entrou de cabeça mesmo na literatura quando largou a faculdade de ciências contábeis e começou a frequentar os saraus. Hoje ele se dedica em escrever seus textos e a produzir eventos culturais na região onde vive, no interior de Pernambuco, preservando espaços de cultura de resistência.

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