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Olhos fechados

Atenção: Este texto não é recomendado a pessoas sensíveis a violência contra mulher (física ou psíquica) e a gordofobia, nem para menores de 16 anos.

Helena nunca se achou bonita. Todas suas amigas eram magras, altas com olhos claros e seios grandes. Ela era o oposto disso, era baixinha e cheinha. Usava óculos redondos e as sardas salpicavam seu rosto. A garota sempre tentou procurar alguém como ela no cinema ou nos filmes de princesas. Porém, todas eram magras, lindas e loiras.

Ela também nunca pensou que encontraria um namorado. As meninas diziam que se isso ocorresse, Helena teria que agradecer os céus.

Como sempre, a jovem procurou nas páginas dos livros e, finalmente, encontrou alguém como ela. Mulheres que não se pareciam com modelos, que não tinham a pele coberta de pó ou que não comiam uma maçã por dia para parecerem uma vareta ambulante. Não, as personagens eram “comuns” e aquilo a fez amar tais livros. E quando a protagonista encontrava um homem, ele era alto, bonito e rico. Talvez as chances de Helena não fossem tão escassas afinal. Porém, havia algo em tais histórias que a incomodava. Algo que ela deixou no fundo da mente adormecido.

Um ano depois, a garota de 16 anos encontrou um jovem chamado Felipe, que se tornou seu namorado meses depois. Tudo corria bem até morarem juntos, dois anos depois. O jovem bebia todas as noites depois do trabalho. Uma vez ela tentou pedir que ele no mínimo tomasse um banho, antes que quisesse a levar para cama e, segundos depois, caísse no sono. Aquele fora seu erro.

O primeiro tapa veio quase em um terremoto. Felipe escorregou nas próprias pernas e o tapa tornou-se um empurrão que a derrubou com o marido e fez seu braço ficar roxo. Para sua sorte, ele adormeceu ali mesmo, no chão.

Na segunda vez, eles estavam em um jantar do qual tiveram que ir embora, pois ela havia passado mal. Ele a acusou de ter ofendido seu chefe e de ter perdido a promoção. Empurrou-a contra a mesa e pressionou seu rosto contra ela. A força foi tamanha que Helena sentiu dois dentes se partirem, além do nariz. O marido a chutou, descontando sua raiva. A esposa tentou gritar, mas sua voz não saía. Quando não havia mais força em seu corpo, Felipe parou. Ao ver seu estado, a culpa percorreu o rosto dele.

— Me perdoe. Eu te amo. Me perdoe. Não vai acontecer novamente. — O homem ajoelhou-se e abraçou seu vestido branco, coberto por sangue.

Helena se lembrou de conhecer tal frase antes. Porém, não se recordava de onde.

Meses depois, a mulher participou de uma pequena reunião com os amigos do escritório. Seu carro quebrou em meio à chuva e o amigo, Ruan, levou-a até em casa. Helena se surpreendeu ao ver o carro do marido em casa. Ela se despediu do colega de trabalho ao entrar.

Quando pisou em casa, foi atacada. Sentiu-se sendo pressionada contra o chão. O corpo forte de Felipe contra ela.

— Felipe… O qu… — Tentou perguntar, enquanto ele apertava sua garganta.

— Quem você pensa que é? Você é só uma mulher falsa que me traia com esse daí. Acha que ele gosta de você? Acha que alguém além de mim vai te amar, gorda do jeito que é? Se eu não estiver na sua vida, ninguém mais vai te querer.

Helena tentou contestar, dizer que não havia nenhuma traição. Então ela se lembrou de onde havia lido as palavras da última vez, nos mesmos lugares que havia lido as que ele dizia agora. Dos livros que diziam que um pedido de desculpas significa arrependimento. Das palavras que diziam que ciúme e perseguição era amor. Porém, os livros não contavam sobre o momento em que não havia mais ar em sua garganta e que seus olhos não se abririam mais.

 

Sobre a Autora:

Clara Formatti nasceu em São Paulo, capital, e sempre amou ler e se aventurar em mundos fantásticos. Aos 16 anos começou no mundo da escrita através de fanfics até que aos 18 iniciou seu primeiro original de fantasia que foi publicado em 2020 e é o primeiro de uma trilogia: Sussurros da Floresta: A última sacerdotisa.

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