Depois de uma noite de um sono conturbado e interrompido por lembranças e medos da infância e da atualidade, Elisa abotoava o sutiã quando a mãe entrou no quarto trazendo uma caneca de café.
— Vou colocar aqui na cômoda — disse dona Sandra, secamente.
A delegada olhou para a caneca.
— Não precisava. O Tavares sempre faz logo que eu chego.
— Não me custa voltar a acordar cedo pra servir mais um delegado.
— Ele não era só um delegado, era o seu marido.
— Elisa, está aí o café. Se quiser, toma, se não quiser, deixa aí.
A mãe saiu num rompante. A filha, depois de beber o café, lembrou-se da farda lavada pela mãe deixada no antigo escritório do pai e foi apanhá-la. Ao passar a entrada da sala deu de cara com Danilo sentado no sofá.
— Bom dia — saudou o estagiário com um sorriso ao ver a delegada apenas de sutiã.
— Tavares, o que está fazendo aqui? E a uma hora dessas… — disse enquanto fixava o olhar no cabide ao lado da porta.
— Dormi com a minha avó essa noite e a casa dela é aqui perto. Aí resolvi dar uma carona a pé.
— A bolsa da minha mãe não está no cabide, ela saiu?
— Olhos de investigadora até em casa. Ela estava saindo quando eu cheguei. Me deixou entrar e partiu.
— Ela parecia meio triste?
— Não, por quê? Vocês discutiram?… Desculpa, não tenho que…
— Só um desentendimento básico. A gente nunca se deu cem por cento e ela não aceita muito o fato do que eu escolhi pra mim e…
— É por causa do seu Rubens?
— É. Acho que no fundo ela nunca gostou do meu pai ser delegado e agora eu também.
— Ah, ninguém gosta de parente policial. A gente sempre tem medo de acontecer alguma coisa. Minha avó mesmo quase morre quando contei que estou estagiando na delegacia.
— Eu até entendo, mas se fosse só isso acho que ela poderia aceitar melhor. Acredita que ela jogou todas as coisas de trabalho do meu pai fora? O escritório só tem livros e poeira.
Elisa foi andando em direção ao escritório acompanhada de Danilo. Logo abriu a gaveta da mesa.
— Olha só. Tudo vazio. Ia me ajudar tanto. Ele anotava tudo.
— Realmente — respondeu o estagiário distraído olhando o decote da delegada.
— Pega essa farda pra mim... Tavares, a farda!
Danilo atentou-se e entregou a blusa a Elisa, que a vestiu e tornou a retirar os poucos papeis picados restantes na gaveta até deixá-la vazia e perceber uma diferença.
— Esse fundo é falso.
— O quê?
— O fundo dessa gaveta é falso.
Enquanto dizia foi arrancando a gaveta e colocando sobre a mesa. Retirou o falso tampo e um envelope foi revelado.
— Acho que minha mãe não sabia dessa façanha do seu Rubens — disse abrindo o envelope e lendo o que parecia um contrato.
— Saulo Peçanha… Jordi Gonçalves… quem é esse?
— Olha que a cidade é pequena, mas esse nome eu nunca ouvi.
— Vamos pra delegacia agora. Quero uma ficha desse homem imediatamente.
Capixaba natural de Ecoporanga, atualmente residindo em Feira de Santana-BA; estudante de Pedagogia, escreve desde criança. Apaixonado por café, criança, história, arte e cultura brasileira. A Arte de Viver foi sua primeira novela publicada, além da coletânea Contos Oh! Ríveis, de humor, estando presente em coletâneas de contos e poemas do Projeto Apparere e contos disponibilizados na Amazon.
O gênero policial vem sendo seu novo foco na escrita, explorando a temática familiar, um prato cheio para discutir as relações da sociedade e refletir sobre as atitudes passionais.
Comments