— Você está demitida!
Ela não podia acreditar. Depois de tudo o que ela tinha feito pela empresa, depois de todo o sacrifício pessoal que ela vinha realizando, não poderia ser demitida quando mais precisava do emprego. Não era justo. Ela precisava fazer algo. Ela precisava, e ela faria. Manteria aquele emprego a qualquer custo.
— Você não pode. Não vai me demitir, agora.
— Não posso? Pois, já está feito! Passe no setor do RH, que as suas contas estão esperando por você.
Então ele havia premeditado aquilo. Chamou-a à sua sala para expô-la ao ridículo, para apresentar resultados inalcançáveis, provar uma suposta incompetência. Tudo para demiti-la. Ele somente queria uma razão para justificar sua demissão. Mas, com algo, ele não contava. Ela tinha uma carta na manga. Ela sempre tinha uma carta na manga, como um anjo sussurrasse sempre em seu ouvido as melhores saídas para seus problemas.
— Não posso ser demitida. Tenho estabilidade.
— Virou líder sindical, agora? - e Alvo Galhardo gargalhou com intensidade digna de um vilão de desenho animado. Seus funcionários não eram sindicalizados, ele sempre se assegurou disso.
— Estou grávida.
Fez-se um silêncio sepulcral.
— Como assim, grávida? - ele perguntou, após seus olhares se cruzarem ameaçadoramente, por aproximadamente um século de silêncio.
— Como? Grávida, como? Como as mulheres ficam após a fecundação, ora! Como mais? Seus pais não lhe ensinaram como acontece? Primeiro um indivíduo do gênero masculino introduz uma sementinha…
— Como ocorre a gravidez, eu sei. Não tente me fazer de idiota, ou verá que a idiota é você. Você não tem como estar grávida.
— E como não? Deixe-me refrescar sua memória. Estou grávida de três semanas. Não lhe diz algo?
— Diz que você é uma puta barata. Há três semanas, estávamos juntos, e usamos preservativos todas as vezes. Quem é o pai?
— Camisinha é um ótimo recipiente. Depois, basta furar e mandar tudo para dentro.
Alvo ficou branco.
— Então, você vai me demitir. Ok. Nos vemos na justiça do trabalho? Assédio e demissão de estável. Provo com exame de DNA, e ainda ganho uma boa pensão, depois que o rebento... rebentar.
Ele não acreditava. Sentiu que produziam faísca desde o primeiro dia em que se viram, na entrevista de emprego. Desejaram-se desde então. Ele resistira como pôde: tentou impedir a contratação, mas ela tinha um currículo muito bom; então, ele impôs trabalho superior à capacidade de qualquer outro funcionário, para que ela não desse conta, se sentisse pressionada e pedisse demissão, mas ela virou a noite trabalhando e mostrou ótimos resultados, e ele se viu obrigado a passar noites com ela, por ordens de seus superiores, para auxiliá-la em seu excelente trabalho. Foi num desses momentos, que eles não resistiram. Ela também gostara dele desde o princípio, e o tesão pelo homem foi mais forte do que a raiva que sentia do chefe que ele era. Durante a madrugada, batizaram todas as mesas dos colegas, a sala de reunião, e todos espaços possíveis da empresa, por quase quinze dias. Primeiro, durante a madrugada, em seguida, a qualquer hora em que desse vontade. Começava a ficar arriscado. Namoro entre funcionários era proibido na empresa, e ele não podia perder aquele emprego. Terminou o relacionamento, parou de ajudá-la, passou a reclamar de cada vírgula errada no relatório. Fez da vida dela um inferno sem precedentes.
E ela continuou dando conta.
Mas, um dia, o cansaço falou mais alto. Ela cometeu erros graves, deixou de reportar elementos cruciais aos investimentos da empresa, não terminou a elaboração do dossiê. Ele finalmente a demitia. E ela não seria mais demitida. Pior do que isso, ela segurava o emprego por pouco mais de um ano, mas ele seria demitido. Com certeza seria. Namoro é vedado? E se alguém falasse em assédio? Ela ameaçava falar em assédio.
— Rebecca, existe qualquer chance de isso ser uma brincadeira de mau gosto?
— Nenhuma, senhor Galhardo.
Rebecca sabia que não havia bebê algum. E sabia que, se seus erros provocassem prejuízo à empresa, alguém poderia falar de falta grave. Mas, ela queria que ele assumisse os erros, ou pelo menos sua participação nos erros. Mas, por quanto tempo poderia sustentar aquela situação?
Alvo Galhardo sabia que ela era, desde o princípio, sua perdição. Desde o princípio! E, finalmente, seria punido. Resistiu por três semanas a qualquer aproximação, mas ia ser punido mesmo assim. Para o resto da vida, pois teria um filho. Iria começar a criar o filho estando desempregado. Quem daria um novo emprego a um pai de assédio sexual? Seria antes linchado.
Alvo fitou Rebecca. De pé, ela o encarava com aqueles grandes olhos castanhos, que pareciam faiscar. Ele correu os olhos por sua pele branca quase transparente, por seus cabelos ruivos, que pareciam em chamas, e, como tivesse visão de raio-x, perscrutou as curvas de seu corpo perfeito, por debaixo do formal terninho que ela vestia. Parecia ver sua pele arrepiada, como ela sempre ficava, em sua sala gelada. Ela era sua perdição. Inevitável.
Ela, que o observava ameaçadora como uma loba protegendo os filhotes, logo observou a mudança de expressão de seu chefe imediato. Sentiu-se, por dentro daquela indumentária profissional, como uma onça no cio. Ninguém jamais a fizera se sentir tão sexualizada como aquele homem duro e ensandecido. Sentia-se irremediavelmente mulher.
Arrepio à parte, Rebecca sentiu calor. Tirou o terninho, pôs sobre o encosto da cadeira e sentou-se. Cruzou as pernas, claro. Alvo quase enfartou. Ambos entenderam que, se não negociassem logo, tudo estaria perdido. Para os dois.
— Ok. Eu lhe ajudarei com seus relatórios. - Falou com sacrifício.
Ela achou pouco. Mas, sentiu que era sua vez de dar um passo. Curvou-se para frente, dando destaque ao decote. Sabia que ele não resistia às sardas de seu busto. Então, falou, languidamente.
— Tiro o bebê, se você prometer que me tratará melhor.
Ele sentiu seu coração palpitar. E outras partes. Mas, duvidou que ela fosse perder a garantia fácil, assim.
— Continuarei tendo provas de nossa relação proibida, mas, não quero usá-la. Preciso apenas de sua ajuda.
Ele sentiu o peso da chantagem.
— Assumo o filho. Procuraremos outra empresa, se for preciso. Mas, você sabe que não houve assédio sexual. Isso ia acabar com minha carreira.
— Quero condições de trabalho. Você me garante isso? Um volume razoável, não aquela montanha de serviço que você me dá. E uns dois ou três assistentes.
— Você sabe que não tenho poder de montar uma equipe assim.
— Reuni alguns dados. Sozinha, aumentei a renda de responsabilidade do nosso setor. Nossa demanda e responsabilidade cresceu. Quer relatórios com os argumentos? Terá em sua mesa.
Eram bons argumentos, ele pensou.
— Posso tentar.
— Consiga!
— Aborto?
— Sim.
— Terá que passar um tempo afastada.
— Aborto é crime. Consigo que o atestado seja por doença infecciosa.
— Terá que assumir os erros que deram prejuízo.
— Jamais! Você assume comigo.
— E o que vou dizer?
— Que aconteceu porque estamos sobrecarregados. Forme a equipe, ora! Você sabe negociar.
— E agora?
— Agora, o quê?
— A sala da copiadora está interditada.
Ela entendeu imediatamente. Era isolado, era afastado.
Selaram o pacto com um encontro de carnes.
A discrição me obriga a não perguntar nada mais, Cristiano! 😂😂😂
Isso me fez lembrar de uma antiga colega de trabalho.
Amei
Melhor jeito de fechar um acordo, será? 🤣